Daniela Schmitz Wortmeyer
Um poema que não te ajude a viver e não saiba preparar-te para a morte
não tem sentido: é um pobre chocalho de palavras.
Mario Quintana
Certa vez um
amigo me contou uma história, que trazia uma imagem mais ou menos assim: uma
mulher fazendo um bordado sobre uma mesa alta, com os fios pendurados para
baixo. No chão havia crianças pequenas sentadas, que olhavam para cima e viam
aquela mistura de fios entrelaçados. Sem conseguir enxergar a figura que se
formava sobre a mesa, as crianças não vislumbravam qualquer sentido naqueles
fios, considerando tudo uma grande confusão.
Meu amigo me
disse que é desse modo que os seres humanos enxergam os fatos de sua vida, o
seu destino: como uma confusão sem sentido, porque não podem perceber o que
está sendo formado em um plano superior.
Fiquei
pensando como os fios de nosso destino formam quadros tantas vezes difíceis de
decifrar. É comum arquitetarmos projetos em nossas mentes, de coisas que
gostaríamos de realizar e conquistar, acreditando que dessa maneira
alcançaremos a idealizada felicidade. Formamos um quadro com nosso raciocínio,
um modelo de realização - que é influenciado não apenas pelos nossos desejos
pessoais, mas também pela cultura em que vivemos, pelos valores familiares,
sociais, midiáticos... E geralmente não considera o movimento da tessitura do
destino.
Chega a ser
curioso como, em certos momentos, parecemos estar no comando do veículo que
conduz nossa vida; porém, em outros, é como se a direção nos fosse tomada, e
ficássemos completamente impedidos de desviar o rumo dos acontecimentos. Relutamos,
esperneamos, tentamos influenciar a configuração do quadro de muitas formas,
com mínimo sucesso. Leva tempo para aprender que, em vez de desperdiçar energia
nessa batalha inglória, mais sábio é aceitar a situação e procurar responder da
melhor maneira possível ao chamado da vida. Afinal, somos pequenos demais para enxergar
o quadro que está sendo formado no ateliê do destino...
Velhas histórias,
assim como enredos contemporâneos, narram trajetórias de desenvolvimento de
heróis e heroínas, sempre marcadas por diversos tipos de obstáculos e ameaças
ao alcance da meta pretendida. No decorrer do percurso, os protagonistas são
testados em suas capacidades e descobrem talentos insuspeitados, lapidando
virtudes e colhendo aprendizados. Ao final da saga, houve um desabrochar da
personagem, que brilha em força e sabedoria.
De fato, toda
essa jornada ficaria empobrecida diante de um percurso sempre previsível e
cômodo, em que todos os desejos iniciais fossem prontamente atendidos. É nas
lutas cotidianas que se forjam heróis e heroínas, atravessando precipícios,
desvendando enigmas e enfrentando os monstros do dia a dia - muito embora esse
processo possa exigir um amadurecimento interior bastante custoso e desafiador.
Após uma etapa de aventuras, o principal tesouro conquistado talvez seja
percebido no olhar de quem ampliou sua bagagem de experiências, percorrendo
lugares nunca antes sonhados e desenvolvendo-se como ser humano.
Frente a
dificuldades e obstáculos, apesar dos golpes e noites mal dormidas, entremeamos
cores no quadro de nossa existência. Cada etapa de nossa saga foi tecida por
alguma razão, ainda que não consigamos vislumbrar um sentido imediato. E, mesmo
que aparentemente tenhamos perdido o controle de nosso destino, a forma como
nos posicionaremos diante das situações será de nossa escolha. Uma escolha que
conformará a matéria-prima de novos fios, com os quais serão tecidos mais e
mais quadros, produzindo histórias que podem ser dignas de se contar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário